quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Os velhos.

Sempre gostei de velhos. Melhor dizendo, já que este termo pode ser considerado pejorativo, sempre gostei de pessoas idosas.

Adorava a minha avó Ana que viveu sempre connosco até morrer com mais de 90 anos. E as histórias dela e das irmãs que conheci, quase todas chegaram perto dos 100. Tenho uma fotografia delas a rirem muito, vestidas de escuro por serem viúvas, com os seus cabelos brancos e carrapitos.



Na minha vida tenho várias pessoas de muita idade, ou seja, idosos, que estimo muito. E respeito. E admiro. E de cujas histórias não me quero esquecer.

Durante anos, quando passava férias em Trás-os-Montes, os velhos dominavam vilas e aldeias, o Ti Zé Racha (lê-se txa) com o seu cajado sentado à porta de casa, o Ti coveiro, as tias já sem idade certa que ofereciam lanches de presunto e vinho fino nas tardes quentíssimas do Douro.

O mesmo em todos os locais, mais visível fora da capital.

Moro num bairro que só agora começa a ter velhos. Quando para cá vim viver, há 32 anos, éramos todos novos. Eu ainda estava na faculdade. E os outros habitantes de Telheiras, da EPUL, não a dos novos ricos que pertence a Carnide e era campo de pasto para rebanhos, também eram casais novos.
Havia ali em baixo, onde agora é o metro, uns restos de casas antigas, casas de zona saloia, de trabalhadores agrícolas das quintas que aqui existiam. Acho que havia alguns idosos, restos doutro tempo.

Vi envelhecer muitos vizinhos que na altura teriam mais uns 10 ou 15 anos que eu. Talvez menos. Há aquelas pessoas que conhecemos de vista desde sempre. Agora têm netos.

A mudança do meu dia-a-dia, nos últimos meses, permite-me viver muito mais o bairro, a cidade e também o campo. Aí, os velhotes continuam a dominar, sentados nos bancos, de bicicleta, a conduzir um tractor ou a apanhar azeitonas no caminho das oliveiras. E a nossa vizinha da casinha, cheia de dores, mas sempre bem e disposta a dar. Todos os dias dá almoço a um sobrinho. E oferece-nos pão e caspiadas feitos por ela no forno de lenha. Tem uma pensão de duzentos e poucos euros.

E os idosos modernos, bem de saúde felizmente, como a minha mãe que aos 78 anos se tornou actriz nas peças do neto, usa as novas tecnologias e também dá almoços e jantares ao neto, e a todos os netos, todos os domingos. E umas ajudas para isto e para aquilo.

Felizmente, por causa da mania da prática do desporto, a cidade, ou os bairros como o meu, possuem equipamentos e espaços verdes que permitem praticar alguns exercícios sem gastar um tostão. A que chamo ginásio. Lá estou eu, muitas vezes com um senhor muito idoso. Até tenho medo que se desfaça mas não. Resiste. E outros passam com carrinhos com bebés. E a meio da tarde, é ver pela rua avós e netos, perto das escolas.

Que seriam dos jovens pais de hoje sem os avós?!
Que seriam dos jovens de hoje sem os avós? Que seriam dos avós sem os netos?

E resistem estes velhos, os idosos, apesar dos degraus altíssimos dos transportes, apesar dos cortes, apesar da chuva e do frio. Têm um passado e um presente de trabalho, seja na cidade ou no campo. Continuam a trabalhar e a ser um activo na sociedade. A maioria. Há excepções, os doentes e os aldrabões, e os muito ricos com criados, mas são mesmo poucos e estão escondidos. A maioria anda aí a ajudar a família, duma maneira ou doutra, com dores físicas e dores na alma de ver os netos partir por não terem trabalho apesar dos estudos.

Por tudo isto e muito mais, esta doutrina de exterminação dos velhos que este governo fomenta me enoja. Felizmente, os velhos resistem à sua maneira.

Nas empresas, os velhos somos nós, os de cinquentas ou mesmo quarentas. Deixámos de servir. Temos saber e opinião e dizem-nos que seremos muito mais felizes cá fora... Precisamos resistir uns 15 ou 20 anos apenas até termos uma pensão que não sabemos se vai existir... 
Resta-nos aprender com os velhos a resistir para continuar a viver.

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