terça-feira, 5 de agosto de 2014

Perto tão longe.

Para a Gisela.


Uns dias fora do sítio habitual fazem muito bem. 

Até podemos estar perto mas mudar de casa, de cidade ou aldeia, de terra, permitem que, aos poucos, nos distanciemos das coisinhas do dia-a-dia que tantas vezes nos atormentam sem necessidade.

À medida que os dias passam, um processo natural leva-nos a separar o trigo do joio, ficando apenas o que interessa e quem é importante.

No meu caso, essa sensação de leveza não surge logo mas acentua-se nos últimos dias antes de regressar quando um nó começa a apertar o estômago devagarinho já com saudades do tempo de lazer que ainda estamos a usufruir.

Nesses últimos dias, que antecedem o “voltar à caixa de correio”, como diz a minha amiga Manela referindo-se ao regresso de férias, é quando a sensação de bem-estar atinge o seu auge. É quando começo a gostar tanto daquela vida de “não fazer nada” que chego a ponderar como seria bom viver sempre assim.

O "não fazer nada das férias" é sempre uma azáfama de fazer muito mas sem relógio e com um gozo especial. 

Tomar o pequeno-almoço na varanda, sair para uma volta matinal, como ir ao mercado e ler o jornal numa esplanada, caminhar despreocupadamente até à praia ou caminhar por um sítio descobrindo coisas, detalhes, sem saber as horas, olhar a paisagem, os outros desconhecidos, observar a natureza, nadar no mar, olhar o céu e pensar desorganizadamente…

Não é preciso ter dinheiro extra. Apenas amigos ou familiares que funcionem como anjo da guarda e nos disponibilizem, a custo zero, uma casinha, um abrigo, um sítio. De preferência num local privilegiado. 

A Gi .
É o meu caso que tenho uma amiga que me obriga a ter a todo o ano a chave da sua casinha especial. Para mim, de férias. 

É a nossa casinha, não é minha, diz a Gi com ar afirmativo. Abre muito os olhos e ameaça cortar relações se eu deixar dinheiro, comprar papel higiénico ou limpar a casa durante os dias que lá passo. Claro que transgrido. Por causa das limpezas, raspei o cabo da vassoura no olho... 
Há poucas pessoas assim mas eu tenho a sorte de ter algumas na minha vida. 

A casinha dela é um must de modernidade e bom gosto no meio de um bairro de pescadores e alguma lumparia que, felizmente, a classe média que ainda tem dinheiro para férias desconhece.

A casinha.
A casinha tem tudo o que gosto. 

Que passa por não ser um condomínio fechado com piscina, muitos seguranças e muitos BMWs à porta.
   
Ali há vizinhos reais, velhotes que nos vigiam e dão por qualquer acontecimento fora do habitual. 

Há tascas de peixe, de antigos pescadores, que grelham e servem almoços buffet a 10€, tudo incluído, peixe delicioso vindo directamente do mar de manhã 

O Ivomar.
Há gente na rua de manhã até à noite mas também sossego para olhar o rio e o mar ao longe a ouvir música.

Dá para não mexer no carro e ir ao centro da cidade desde que queiramos andar umas centenas de metros a pé. E eu quero.

Desce-se o Viso, atravessa-se o Tróino, sempre entre ruas estreitinhas feitas de casario antigo e cheias de povo que fala alto e olha para nós com curiosidade, chega-se à baixa, onde há tudo. 

Volta-se pelo mercado do Livramento, um dos melhores que conheço onde a dificuldade é não comprar tudo, da fruta e legumes ao pão e ao peixe. Ai o pão! E as azeitonas!

Há homens em grupos à volta do mercado, de pé e nos bancos da avenida, em cafés e tascos. Não dá para não comparar com as cidades do mediterrâneo ou árabes que conheço.

As praias ali perto implicam transporte mas consegui reduzi-lo ao mínimo caminhando uns quilómetros largos todos os dias como gosto. 

As praias são de areia branca e limpa, montanhas verdes atrás e água transparente, muitas vezes fria. Gosto dali, gosto muito, traindo a minha origem algarvia e teimando que prefiro aquelas praias que também acabam por nos nos levar ao Sul.


Talvez todos os sítios sejam bons se gostamos, se nos identificamos, se estamos bem. 
Eu estive bem.

Quando cheguei a casa, centenas de mosquitos pequeninos tinham invadido a cozinha por causa dum kiwi esquecido que apodreceu. Foi a minha caixa do correio. 

4 comentários:

  1. estar de férias é muito bom é muito bom, estar de férias é muito bom muito...é bom camarada é bom camarada ébom é bom!!!!
    Bjnhos para ti Gisela
    e para ti gorda

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  2. Relato fiel das tuas preciosas férias.

    Nem todos se podem gabar de ter uma amiga como a Gi.

    Não só pela casinha,mas pela pessoa que ela é de uma humanidade que se vai tornando rara.

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  3. Krida CAT, obrigada, obrigada mesmo, mas não mereço tantos elogios e mimos ... Sou uma comum mortal, que vista através dos teus olhos, me transformam em algo de outro planeta .. Andamos por cá, nesta caminhada, para partilharmos. Desejo-te tudo o que considerares FELICIDADES, AMIGA. B'jinhos doces, como tu, Gi, sempre ao dispôr :)

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