domingo, 4 de outubro de 2015

A Catarina.

A Catarina era mãe de uma grande amiga minha. Morreu. A sua morte era esperada, serenamente esperada, depois de muito sofrimento do corpo e da alma. Não devia ser possível que o fim fosse tão doloroso, já basta o próprio fim.

Eu gostava da Catarina, ríamos juntas. O sentido de humor é uma característica daquela família, daquelas mulheres, mãe e filha. 

O humor ajuda muito a superar as adversidades. Sei isso pelo meu pai. Rirmos de nós e da nossa situação. Sobretudo quando é agreste e rir é ainda mais difícil. Alivia.

A Catarina nunca se queixava apesar dos anos de diálise, braços furados, veias inchadas, dores fortes no corpo, mau estar... E a terrível dependência para os rins funcionarem. Tudo suportado com um sorriso. Sem dúvida que para tal contribuiu a minha amiga e a sua capacidade de dar, cuidar, rir e fazer dum momento de angústia uma festa. 

A Catarina não ficava em casa. Apoiada numa bengala ou numa cadeira de rodas, havia sempre programa organizado pela filha.

Há meses, no começo do Verão, a minha amiga juntou família e amigos mais próximos, num domingo luminoso de Junho, sobre o pretexto duma caracolada para a mãe. 

Realmente, foi uma despedida mas ninguém no momento se lembrou disso. 

A Catarina lá estava, sentada à sombra duma frondosa árvore, rodeada de amigos.
A minha amiga conseguiu empurrar a cadeira de rodas da mãe e dar voltas ao jardim, brincando como se de uma criança se tratasse. 

A Catarina refilava mas alinhava, sabemos que cheia de dores.

Tempos depois desistiu da diálise, não querendo suportar mais aquele tormento. Fui vê-la, conversámos. Rabujou dizendo que a filha estava cada vez mais endiabrada. Ela, muito afeliada (um termo do nosso Algarve comum). Nesses dias só a morfina permitia aguentar.

Por fim, a Catarina morreu. Durante a noite. Sem ruído, com o seu belo sorriso de mulher bonita, pequenina, do Sul. 

A Catarina teve a melhor filha do mundo, a minha amiga. Não conheço mais dedicação e atenção, mais altruísmo, mais bondade. Melhor fim de vida. 


No velório, lá estava a Catarina, sossegada. A minha amiga com o seu olhar e sorriso doce, enternecida com a mãe. Também ali. Rodeada de mulheres.

Era um domingo de Agosto. Dois meses depois do outro domingo, também este foi de sol e calor abrasador. Fiquei na sombra da porta da capela a observar enquanto rezavam um terço sob a vigilância de uma imagem de outra mulher imaginada santa. 

Eu não rezo e, nestes momentos de emoção, não me assalta qualquer fervor religioso antes repenso sobre a injustiça de Deus e da sua doutrina.

A minha amiga tem uma fé inabalável e acredita que encontrará a mãe mais tarde, um dia, no reino dos céus ou noutro espaço qualquer belo e tranquilo.

A vida destas mulheres é um exemplo de afecto e vontade que contradiz o comportamento da sociedade actual para com os velhos, os pais e os familiares ou amigos na hora da doença, do sofrimento, da morte. 

Não tenho a capacidade de dar da minha amiga mas quero muito seguir o seu exemplo quando um dia for necessário. Serei capaz?




2 comentários:

  1. Obg., obg., obg., Krida AMIGA CAT! Em meu nome e no da minha Mãe, que gostava muuuuuuiiiito de ti, onde quer que ela esteja, estará grata por teres sido sua/nossa AMIGA. O nosso eterno agradecimento.

    As melhores prendas, como esta e a outra (sobre a nossa "Casinha"), são/foram-me oferecidas por ti.

    Especial? Especial és tu, Cristina e, sempre e quando precisares de mim, cá estarei e quero que contes comigo.

    Bem hajas! És a fantástica TRIPOLAR, que faz o favor de ser minha AMIGA, assim como os teus Mãe, filho e irmã.

    E agora? como te poderei agradecer, sem ser por escrito, se as lágrimas, de comoção, não me deixam fazê-lo?

    CAT, desejo-te tudo aquilo que considerares FELICIDADES! E... por favor, continua TRIPOLAR!!!

    B'jinhos doces e enormes, como o teu coração, da tua Gi, filha de Catarina :)

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  2. OLÁ, KRIDA AMIGA CAT! ACABEI DE RELER "CATARINA" E, PARA ALÉM DA NOSSA FOTO, ONDE ESTOU TÃO GORDINHA, BENZA-ME DEUS... QUERO AGRADECER-TE, 1 VEZ MAIS, A AMIZADE, A TUA FANTÁSTICA ESCRITA E PEDIR-TE DESCULPA POR NÃO ESTAR À TUA ALTURA E NÃO CONSEGUIR AGRADECER-TE COMO MERECES. DESEJO-TE O QUE TE DESEJO DURANTE TODO O ANO: SAÚDE E TUDO O QUE CONSIDERARES FELICIDADES! OBRIGADA CRISTINA! QUE DEUS (O MEU) TE PROTEJA E AJUDE, SEMPRE. B'JINHOS GRANDES E DOCES, COMO O TEU CORAÇÃO, Gi :) OBRIGADA! OBRIGADA! OBRIGADA!

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