sábado, 8 de março de 2014

Ser e Fazer.

Mais de cem anos depois dos dias em que as mulheres, recém-integradas na mão-de-obra industrial, lutaram por condições dignas de trabalho, ainda é preciso existir um dia para chamar a atenção para a situação da Mulher.

Rússia, 1917
A Mulher continua descriminada e desigualada, num segundo plano a muitos níveis: poder, decisões, vida, trabalho, liberdade de ser.


Há dias li um livro que me transportou para a sociedade do final dos anos 60 e início dos 70. Memórias de uma mulher que começou muito jovem na luta política e social, saiu do país sozinha aos 17 anos e só voltou depois do 25 de Abril. Participou nas revoltas estudantis de Maio de 1968 em Paris. Experenciou o movimento hippie. Uma mulher livre e lúcida.

Capa: pintura de Mário Botas, "A Pátria", Setembro 1983
Ao ler as suas palavras, identifiquei-me com ela, apesar de não ter vivido aquela época, pois nasci em 1960. Identifiquei-me no interesse pela política e sociedade, pela vida, pela liberdade, pela independência.

Aqueles foram anos de esperança e de crença na possibilidade de mudar o Mundo. De excessos e de conquistas para o ser humano e a sua liberdade de ser, não só de fazer.

Passados todos estes anos, olhando à volta, vejo uma imensa regressão.

A desigualdade entre pobres e ricos aumentou nos últimos anos. Em Portugal, a fortuna de Belmiro, Soares dos Santos e Amorim, cresceram 17% na lista dos homens mais ricos do Mundo publicada pela Forbes, enquanto aumenta a pobreza da população em geral.

Os acontecimentos de hoje repetem-se assustadoramente, e muito mais rapidamente, como os que antecederam as grandes guerras que repuseram depois uma nova ordem.

Nos anos 60, havia uma esperança. Ainda não tinham caído completamente por terra as hipóteses de uma sociedade mais igualitária, em que os bens seriam distribuídos por todos, com direitos iguais entre homens e mulheres, sem racismo, sem capitalismo avassalador.

Nunca o capitalismo teve uma ferocidade tão descarada como hoje. Bem o sabemos pelo que vivemos em Portugal.

Hoje não há esperança.Todos os dias assistimos a mais e mais dados que contribuem para esta desesperança.

E as mulheres? Como em todas as crises, sofrem mais, uma vez cortados todos os apoios sociais que lhes permitem liberdade para Ser, não só Fazer. 

Acabo de ouvir alguns números fornecidos pelo European Institute for Gender Equality. Parece que face à situação actual, quanto ao item do poder, apenas em 2060 se poderá atingir 75% da igualdade com os homens em vez dos 25% actuais.



Neste mapa (que guardei mas sem a fonte), podemos constatar a situação das mulheres na gestão de topo. Falam por si. As zonas mais escuras estão abaixo dos 20%, as mais claras acima dos 40%. Para grande parte de África não há números pois as mulheres não contam, se pensarmos nos países islâmicos, ou não há dados porque ainda andam a tentar sobreviver.


Tudo o que há para dizer não cabe num texto. Neste texto.
É com tristeza que vivo este momento porque sinto que cem anos de luta diária resultaram em tão pouco.

Conheço mulheres fantásticas. A maioria Faz. Algumas não conseguem Ser.


Por isso, a luta continua. E temos que ser todas, em todos os pormenores, a Ser e a Fazer. Nas empresas onde a misoginia domina, como tão bem sei. Na vida pessoal, onde os números sobre a violência física e sexual divulgados esta semana têm que ser invertidos. 

Como desde sempre, é, para nós, sempre mais difícil, é preciso ser forte e não desistir nunca!

1 comentário:

  1. Lamento as diferenças no formato das letras no texto mas não consegui uniformizar. Devia ser toda igual mas os blogues têm desígnios insondáveis :(

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