domingo, 15 de fevereiro de 2015

Não, não somos a Grécia. Reportagem de uma manifestação.

Fui à manifestação convocada para esta tarde, com começo no Largo Camões. De apoio à Grécia, contra a troika. Contra a austeridade. Vi no Facebook. Não sei exactamente quem convocou. 

Quero manifestar-me, fazer alguma coisa mais que estar a teclar contra isto e aquilo, sentada no sofá. Sinto necessidade de agir, acho que é muito perigoso deixar que os outros o façam por nós.

Desde a manifestação de 2003 contra a invasão do Iraque, em que senti força, palavras de ordem com sentido, gente unida, nunca mais consegui voltar a ter essa sensação num protesto. 

Existiu a grande manifestação de 15 de Setembro de 2012 mas não estava em Lisboa e não fui. Acho que essa foi a última grande, com vasta participação de pessoas fora do circuito dos partidos. 

Na seguinte, de 2 de Março de 2013, já foi notória a falta de força, de energia, de gente nova. Lembro de me sentir frustrada com a ausência de palavras de ordem fortes.

A concentração no Rossio "por Kobani" teve umas dezenas de pessoas com boa vontade... 




Hoje a sensação foi pior apesar das centenas de pessoas. Que não foram milhares. Como se justificava.

Confesso que, apesar de saber que não há em Portugal uma força política agregadora com capacidade para acolher a revolta generalizada das pessoas sem partido, uma coligação como o Syriza, achei que os acontecimentos da Grécia fariam muitas saírem de casa e gritarem contra a austeridade e em apoio ao governo grego.

Mas não. Nós não somos mesmo a Grécia, nem Espanha. Nós marimbamos. Deixamos que o destino, a nossa senhora de Fátima, ou a simples inércia, decida o nosso futuro.


Na manifestação de hoje estavam sobretudo pessoas ligadas ao Bloco de Esquerda ou a outros, dissidentes ou coincidentes. 


Senti-me bastante out. Fiz todo o percurso nas filas da frente, atrás duma faixa que dizia  "o medo mudou de lado". Não conhecia ninguém, com excepção para as figuras públicas, como o António Pedro Vasconcelos que seguiu parte do caminho ao meu lado. 


Não sei quem escolhe as frases a gritar mas estas eram demasiadas e difíceis para quem não as conheça previamente. Algumas não entusiasmavam pois não faziam sentido. Pareciam quase improvisadas, com pouca sustentabilidade. 

Apeteceu-me falar com alguém da organização, que não descobri, para dizer que os slogans tinham que ser doutra forma e a direcção da manifestação também.

Só quando a Mariana Mortágua do BE pegava no megafone havia uma dose de energia que esmorecia ao fim de três ou quatro declamações.

Talvez o facto do céu estar pesado, denso de cinzento, como se fosse abater-se uma tempestade, não tenha ajudado.

A maioria das pessoas está lá a fotografar, a filmar, a fazer selfies e a escrevinhar no smartphone em vez de abrir a boca para protestar. 

Quando chegámos ao pequeno largo Jean Monnet, nada aconteceu, se houve discursos não dei por isso. Pelo menos até me ir embora, farta de esperar.


A minha tristeza não é para com os que foram, de partidos ou não, mas para com os que não foram. Estariam a celebrar o Carnaval?


A minha tristeza é por não ver a esquerda unir-se, mais centro ou mais radical, contra a austeridade, a bem do país.  

Caramba, não serão capazes de encontrar uma dúzia de pontos comuns (luta contra a desigualdade, contra a pobreza, contra o desemprego, pela recuperação económica, defesa da saúde, ensino, justiça, cultura) que os una para derrotar este governo?


Hoje tive a sensação que não era aquela a manifestação. Que o momento exige uma outra, com garra e união, que consiga envolver e tirar de casa os milhares de portugueses que reclamam contra a austeridade e as políticas de destruição do país imposta pela troika. 


Não temos nem syriza, nem podemos. Afinal, o que queremos? 

2 comentários:

  1. Não podia estar mais de acordo contigo sinto exactamente o mesmo.

    Na penúltima manifestação em que estive estavam pouco mais que uma dúzia de pessoas o discurso era terrível, ausência total de ideias e de estratégia. em Abril passado fui de propósito a Lisboa para viver de perto as comemorações dos 40 anos de Abril, no Largo do Carmo ainda senti alguma emoção mas a manifestação da Av. onde era pressuposto aproveitar-se a ocasião para gritar bem alto a revolta de ver cair por terra os valores de Abril senti que o pessoal tinha lá ido aproveitar o facto da Av estar fechada ao trânsito e passear numa excelente tarde de Primavera. Não ouvi nada que me emocionasse o pouco que se gritava era confuso e incompreensível. Ideias nenhuma. Regressei triste e vazia. Ontem aqui em Faro tb havia manifestação, não sei como correu, não tenho feedback, a minha maleita e falta de crença retiveram-me em casa, senti que faltava a um dever cívico mas já são demasiadas desilusões, Precisávamos de um syriza e de um podemos à séria e não de partidos de nome novo com caras velhas demasiado conhecidas e conotadas com ideias pouco interessantes. Temos o país que merecemos.

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  2. Olha, mesmo sem ter ido à manifestação, com o teu post senti a frieza da situação. Realmente nas últimas manifestações tem vindo a perceber-se que os portugueses exprimem o seu descontentamento doutras formas, provavelmente com depressões e outras coisas do género.

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