quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

És muito mais feliz lá fora.


Parece que está na moda despedir em nome da felicidade.
Há gestores que, na hora de dispensar colaboradores, invocam as excelentes qualidades dos mesmos para demonstrar como poderão encontrar a felicidade fora da empresa, sem trabalho e sem salário.
Eles, dispensadores, também poderão, resolvida a contenda, jantar e fumar o seu charuto em paz.
Perante a contestação dos visados, que têm família para sustentar, contas para pagar e um futuro para viver, insistem na explicação desse mood fantástico que é poder dar largas à liberdade sem ter que aturar chefes ignorantes e caprichosos ou cumprir objectivos impossíveis.
“Vais ver que és mais feliz lá fora, o dinheiro não é assim tão importante”. Pois não. A convicção das palavras faz pensar que o desejam para eles próprios, qual nirvana.
Na hora do despedimento, este tipo de argumento é dispensável porque não ajuda em nada o funcionário, apenas causa mais dor e indignação.
A narrativa destes gestores é fortemente influenciada pelas sessões de coaching pessoal, pago a peso de ouro, em que tentam atingir um estado de liderança que não lhes é natural, nem nunca lhes será característico.
Podemos considerá-la uma conversa da treta pois, quando chega a hora de discutir valores e condições, a libertação prometida vai-se para vir, então, ao de cima a mesquinhez do pensamento “tudo para mim, nada para os outros”, destruindo em segundos a prometida felicidade.
A fraqueza de muitos dos nossos gestores de sucesso vê-se na dificuldade de partilhar valor.
Passam anos a dissertar sobre a importância das pessoas na organização. O valor da empresa está nas pessoas. Foco nas pessoas.
Estas, imbuídas de crença neste discurso e fé nas suas capacidades, trabalham anos e anos, prescindindo de si e dos seus, com máximo empenho, contribuindo para os resultados, com o sonho de serem um dia ressarcidas desse esforço.
Nada mais falso.
Todos sabemos que não há empregos para sempre e que as empresas procuram, mais do que nunca, a inovação na renovação, associada à juventude e aos baixos salários.
Em Portugal, muitas empresas, apesar de investirem em formação e em programas que visam dar voz aos colaboradores, praticam o contrário. Na hora da saída, humilha-se, aproveitando o momento de fragilidade e incerteza do visado.
Nessas alturas, partilhar algum do valor acumulado, para o qual o colaborador contribuiu, não lhes passa pela cabeça. Apenas despachá-lo rapidamente, envolto numa conversa inútil que visa simplesmente deixar o gestor de consciência limpa.
Seria preferível contratar alguém como o personagem de George Clooney em “Up in the air”, para despedir sem apelo nem agravo. Sem emoção nem envolvimento. Sem promessas dum mundo melhor. Apenas um golpe rápido, em nome da crise e da redução de custos, qual número na engrenagem. Como a realidade.

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