terça-feira, 22 de julho de 2014

Viajar é regressar

Viajar

Viajar es marcharse de casa,

es dejar los amigos
es intentar volar
volar conociendo otras ramas 
recorriendo caminos
es intentar cambiar.

Viajar es vestirse de loco

es decir “no me importa”
es querer regresar.
Regresar valorando lo poco
saboreando una copa,
es desear empezar.

Viajar es sentirse poeta,

es escribir una carta, 
es querer abrazar. 
Abrazar al llegar a una puerta
añorando la calma 
es dejarse besar.

Viajar es volverse mundano 

es conocer otra gente
es volver a empezar. 
Empezar extendiendo la mano,
aprendiendo del fuerte, 
es sentir soledad.

Viajar es marcharse de casa,

es vestirse de loco
diciendo todo y nada con una postal,
Es dormir en otra cama,
sentir que el tiempo es corto,
viajar es regressar”.

Gabriel Gárcia Márquez

Já tinha escrito um texto quando, ontem à noite, li este poema de Gabriel Gárcia Marquez publicado no Facebook por um português que é um grande viajante, Pedro Norton de Matos.

Li e reli, hoje pela fresca da manhã. Está lá tudo, magnificamente dito.

Por isso, abro a página com o poema e refaço o meu texto, reduzindo-o a umas notas pessoais sobre viajar e férias.

Viajar em férias é bom. Conheço quem não goste. Dá trabalho. Quantas vezes, o gozo maior não é a preparação. Imaginar itinerários, planear visitas, descobrir o desconhecido.

Para quem tem medo de andar de avião, como eu, quando chega a hora de partir, de fazer o raio das malas, de tentar levar pouca coisa sem conseguir, de organizar as tralhas, não esquecer nada, chegar a horas ao aeroporto, passar o check-in e a segurança, penso “porque me meti nisto que estava tão sossegada em casa”.

Mas depois, chegada ao destino, o descobrir e conhecer supera as questões logísticas. No regresso, as recordações são apenas as coisas boas.

Gosto de ir a sítios diferentes, com algum índice de dificuldade. Só por questões financeiras, de tempo e do pânico de estar demasiado tempo num avião, me impedem de ir mais longe. 

Também há destinos que não me atraem e outros que atraem muito. Não sei a razão.
Os países do Mediterrâneo, ou na fronteira do mesmo, sempre me atraíram tal como a arte islâmica feita de azul e verde, verde esmeralda, azul turquesa, mosaicos e torres esguias.

Há mais de uma década, assim que o meu filho chegou à adolescência, optei por viajar com ele em vez das tradicionais férias no Algarve, no sítio de sempre, nas praias de sempre.

Foi assim que fizemos algumas viagens inesquecíveis como uma a Nápoles e à costa amalfitana e outra ao Egipto, esta a mais memorável. Ainda bem que o fizemos pois agora seria pouco provável consegui-lo.

Permitiu-me mudar a opinião sobre as pessoas daqueles países que não são todas fundamentalistas islâmicas mas pessoas como nós, apenas com outra cultura e costumes.

Quando fiquei desempregada, este Inverno, a primeira coisa que pensei foi que teria que fazer uma viagem. Sair uns dias. Só longe, com pouco acesso à informação "tuga", de preferência num local com uma língua imperceptível, poderia cortar realmente com a situação vivida.

O plano era ir à Índia, destino que está, desde sempre, nos meus desejos.
Não deu porque convém que tal aconteça preferencialmente no nosso Inverno e as questões processuais do desempregado funcionam como uma prisão, com apresentações e inúmeras obrigações que tornam uns dias de afastamento do local de residência impossíveis.

Acabei por fazer algo que nunca fizera, por questões orçamentais, viajar em grupo, por uma agência. Destino Turquia. Istambul e um bocadinho do resto, que é imenso e rico.
Apesar de não ter usufruído da liberdade de vaguear pelos sítios sem limites, como gosto, o balanço foi muito positivo. Soube a pouco mas aconteceu. Fico feliz por ter conseguido concretizar.


Talvez as dificuldades ajudem a valorizar uma curta viagem de uma semana para um destino que merecia maior extensão e detalhe.

Penso na facilidade que ex-colegas e amigos têm em viajar, como eu já tive. A minha opção significou um mês a menos de subsistência, no pior cenário.

Esta viagem e o que conheci já ninguém me tira. A grande vantagem das viagens é essa. Podemos ficar sem-abrigo um dia mas as memórias dos sítios que conhecemos não nos podem ser roubadas.

Apesar de o afastamento funcionar mesmo bem para desligar do dia-a-dia, desta vez estive demasiado perto de cenários de guerra e destruição. Olhando o mapa, quer a norte, quer a leste ou a sul, há guerra.



Em Istambul, junto ao Bósforo, nos jardins que ladeiam os portos e outras zonas antigas da cidade, viam-se grupos de mulheres e crianças, alguns homens, sentados à sombra, com grandes sacos pretos de lixo carregando o nada dos seus haveres. Refugiados da Síria. Dos que ousaram não ficar nos campos de refugiados e tentam chegar à Europa em busca de uma vida… 

Crianças corriam e brincavam na relva, como todas as crianças do mundo, mas estas ranhosas e descalças, aproximavam-se de nós, muito timidamente, a pedir um euro. Não dá para não ver, para não pensar que podia acontecer connosco.


No dia do regresso, num excelente voo da Turkish Airlines em que deu para espreitar as neves permanentes dos Alpes, um pouco mais a norte, do outro lado do Mar Negro, um avião igual, era abatido por um míssil.

Na Palestina, também não muito distante, a destruição da Faixa de Gaza intensificava-se num terrível cenário de morte.

Pensei na nossa sorte, grata por voltar, sã e salva, ao meu país, à minha casa, à minha rua, aos meus, em paz, "valorizando o pouco"... 
Sonhando partir outra vez.


1 comentário:

  1. O poema lindo.
    O texto muito verdadeiro,posso garantir porque tive a sorte de acompanhar a Cristina.

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