sexta-feira, 10 de abril de 2015

Meritocracia só para mulheres?


Muitas vezes ouvi a resposta “se tiver o mesmo mérito” quando questionei gestores de empresas sobre o facto de apenas os homens "subirem" e acederem a lugares de topo.
Nada me deixa mais indignada pois é uma falácia.
Provem o que provem, tenham desempenho muito acima da maioria dos homens, na hora da verdade, as mulheres não passam das chefias intermédias.
Lembro sempre o que uma colega me disse, há mais de vinte anos, quando eu, ainda jovem, não reflectia seriamente sobre o tema: só haverá igualdade quando muitas mulheres medíocres estiverem nas administrações, como acontece com os homens.
Durante muito tempo pensei nisto como sendo um exagero. Mas, à medida que fui evoluindo na minha carreira profissional, percebi que é absolutamente verdade.
A prática da chamada meritocracia como método que, supostamente, igualiza as oportunidades de todos numa organização, promovendo as pessoas com base nas suas capacidades e no seu desempenho, e não pela posição social, género ou grupo de influência, foi uma tendência na gestão nas últimas décadas.
Aos poucos, tornou-se cada vez mais um palavrão, apenas usado nas ferramentas de avaliação de desempenho, sem consequências.
No caso da mulher, a meritocracia tem sido sobretudo um pretexto para evitar a sua promoção para os mais altos cargos, tal como para rejeitar a introdução de quotas que obriguem a criar igualdade entre homens e mulheres nas organizações.
De repente, passados todos estes anos, que pareciam de ascensão no caminho para a paridade, os últimos números mostram um imenso retrocesso.
Em Portugal, serão precisos setenta anos para se chegar à igualdade de salários entre homens e mulheres. 70 anos! Quase mais um século!
Parece que actualmente, não se vêem mulheres convidadas para falar em conferências, seminários, debates ou eventos de negócio, de topo. E quantas comentadoras de economia aparecem nos canais de informação? As poucas que existem são excepções. Que me lembre, são quase sempre jornalistas, como é o caso de Helena Garrido, directora do Jornal de Negócios.
A realidade parece estar pior para todos os que não são alinhados, que não pertencem a nenhum grupo, ou lobby, que são independentes, que só vivem do seu trabalho, do seu percurso e do seu desempenho.Tudo piora quando, neste grupo, se é mulher.
A actual situação das empresas e da sociedade empurra cada vez mais pessoas para outros modelos de trabalho. Como trabalhar de modo autónomo, criando o seu próprio negócio, como freelance.
Por cá não existem números mas, nos Estados Unidos, sim, relativos a 2014. Estes mostram que há mais mulheres (53%) do que homens a trabalhar e a ter sucesso como freelance. Muito interessante.
Como se escreve no artigo "Why are more women than men freelancing?", de Sara Horowitz para a Fast Company,  a maioria das mulheres chega à conclusão que a estrutura de trabalho tradicional simplesmente não lhes interessa, com as suas mais de 40 horas semanais, os clubinhos, as disparidades na remuneração e nas oportunidades.
Por isso, começam a abandonar os modelos tradicionais e a procurar novas formas de se afirmarem no mundo do trabalho, montando os seus próprios negócios. Tirando todo o partido das tecnologias disponíveis, podem gerir a sua agenda, do modo mais conveniente para conciliar trabalho, casa e família, e concentrar-se no trabalho que consideram gratificante, determinando a sua própria remuneração. Segundo este artigo, estas mulheres estão a viver o futuro agora.
Ao ler isto, senti que também em Portugal esta é a tendência. Talvez por ser a minha opção e a de muitas outras mulheres que conheço. 
Esta é também uma maneira de dar a volta a um sistema que não reconhece o valor das mulheres no trabalho. E de à falsa meritocracia, só para mulheres, dizer não.

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