segunda-feira, 2 de maio de 2016

Sábado com sol.

Sábado com sol, eu sei. Não apetece falar de morte nem de guerra. 

Em geral, apetece que se lixem as chatices, apetece sair e sentir o ar quente.


O meu sábado passou num ápice. Arrisquei não pôr despertador e acordei tarde, com um ataque de tosse para juntar aos da noite em que fui acordando sufocada. Nunca mais estou bem. Preciso de energia, força para as minhas andanças.

Faço um plano de acção para o dia. Como sempre, com coisas a mais do que a realidade permitirá. 


Ainda não saí e sei da morte de Paulo Varela Gomes. Já me perguntara como se estaria a aguentar, a escrever e a publicar. Ando a ler o Hotel dele. Li há um ano o seu texto na Granta com a emoção impossível de evitar. 

E a esperança na possibilidade de fintar a morte... mas depois da morte do António, em Janeiro, sei muito melhor como não há fuga ao cancro, quando é bera. 

Nos cenários de guerra que nos cercam também não se consegue fintar a morte. Todos os dias, surge uma nova destruição, um Aleppo, um drama, uma dor que esquarteja a alma. Não todas.


Passo por aqui (Facebook), revendo o que agita as gentes. Publiquei algumas coisas sobre os bombardeamentos em Aleppo, um ou dois "likes", três, quatro.


Ah, se eu dissesse o que penso dos taxistas, publicasse mais uma foto de viagem ou da infância, da minha mãe ou do animal de estimação que não tenho... quantos seriam?


Sábado com sol, eu sei. Apetece curtir, sair, esquecer. Afinal, pouco podemos fazer por esses desvalidos. Os doentes fatais ou os viventes da guerra.


O dia esteve lindo. Está vento, agora. Prevê-se muito calor para os próximos dias. Há que aproveitar a saúde mesmo quando vai falhando aqui e ali. O nosso mundo, o que afinal podemos dominar.
Temos que continuar, não é? Quem sobrevive. Apesar disto tudo, de tudo o que dói!


Amanhã é dia da Mãe. Maio promete acontecimentos radicais para mim. 


Como escreveu o Paulo Varela Gomes,
«A vida é muito menos cheia de prosápia do que a morte. É uma espécie de maré pacífica, um grande e largo rio. Na vida é sempre manhã e está um tempo esplêndido. Ao contrário da morte, o amor, que é o outro nome da vida, não me deixa morrer às primeiras: obriga‑me a pensar nas pessoas, nos animais e nas plantas de quem gosto e que vou abandonar. Quando a vida manda mais em mim do que a morte, amo os que me amam, e cresce de repente no meu coração a maré da vida.»
— Excerto de «Morrer é mais difícil do que parece», o texto de Paulo Varela Gomes para o número da Granta dedicado ao tema «Falhar melhor»


Paulo Varela Gomes
Sábado, 30 de abril de 2016

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